21/07/2011

Sobre a desindustrialização

Óleo do Diabo

20 de julho de 2011 escrito por Miguel do Rosário em seu blog Oleo do Diabo


Sobre a desindustrialização


Um leitor-amigo entrou em contato comigo para acusar o projeto de governo Lula/Dilma como sendo uma regressão à economia primário-exportadora. Eu respondi que iria buscar dados para respondê-lo e fazer uma análise baseada não em informações tendenciosas colhidas fragmentariamente na grande mídia, mas em fatos concretos.

Adiantei-lhe, porém, que a acusação de economia "primário-exportadora" costuma se fazer a países cuja economia ancoram-se na exportação de produtos primários. Embora a exportação deste tipo de produto seja muito importante para o Brasil, a nossa economia tem . . .

Leia a matéria completa, muito bem fundamentada, no Oleo




13/07/2011

Projeto que sugere controle da Internet é criticado em audiência pública

Projeto que sugere controle da Internet é criticado em audiência pública | Paulo Teixeira
Tramitando desde 1999, o PL 84/99, que tipifica crimes cometidos no âmbito da informática, foi o tema de audiência pública realizada na Câmara dos Deputados nesta quarta (13). O PL é de autoria do então deputado Luiz Piauhylino (PSDB-PE) e o Senado aprovou em 2008 um substitutivo ao texto, apresentado pelo então senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), que acrescenta vários dispositivos de controle e monitoramento da navegação dos usuários na rede.

Durante a audiência, o substitutivo de Azeredo, chamado de “AI-5 digital” por ativistas e entidades da área da comunicação, recebeu duras críticas de vários expositores e parlamentares. “O projeto do deputado Azeredo não resiste de pé, pois contraria interesses democráticos da sociedade brasileira, afronta princípios constitucionais e viola a privacidade dos cidadãos”, opinou o deputado Emiliano José (PT-BA), integrante da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, uma das realizadoras da atividade, juntamente com as comissões de Direitos Humanos e de Segurança Pública.

O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) avalia que o projeto é anacrônico devido às transformações tecnológicas constantes, além de possuir um viés autoritário. “Precisamos recomeçar essa discussão a partir de outras premissas, que não sejam as autoritárias e até mesmo reacionárias. Esse projeto não tem outro caminho que não seja o de ser rejeitado por esta Casa”, defendeu Pimenta.

Leia + sobre o AI 5 Digital  via Deputado Paulo Teixeira


03/07/2011

Lembrando a danceteria Madame Satã - 1984



Fora das FMs

Mario Nery, Jornalista

Duas horas da manhã. Sábado, São Paulo. No porão.

Um punk, cabelos espetados de gumex e corrente na cintura, dança, pula, esbarrando nas pessoas. A música é do The Smiths, grupo de rock britânico pós-punk. Entre o chão e o teto de cimento cru, o ambiente é quente e esfumaçado, os exaustores não dão conta da circulação de ar. O punk pára de dançar. (Agora toca B-52, conjunto americano new-wave). Ele veste um sobretudo que tinha deixado no chão (é preto e vai até os joelhos) e sai da pista. Entra numa saleta ao lado, decorada com sofás velhos e pneus de caminhão e telas de TV grafitadas, com o nome Estação Madame Satã.

Na pista abarrotada, uma garota, cabelos bem curtos pintados de loiro, dança sozinha com um copo de vodca na mão. O vestido é um canudo preto colado ao corpo, e ela gira sobre ele, sacode as ancas e sorri para os lados, satisfeita com sua performance. Num canto, outra garota, boneca chinesa de quimono vermelho e lábios lilases, dança em movimentos comedidos, delicados, quase cerimoniais, como se ouvisse uma música pentatônica. Mas é o David Bowie que toca.

Outro cara, de cinto com J maiúsculo na fivela, sapato afinado no bico e cabelos alinhados, toma cerveja encostado à parede e assiste às dezenas de pessoas que dançam freneticamente. Com as luzes estroboscópicas relampejando no salão, elas parecem estar eletrizadas, fazendo movimentos que se interrompem com os momentos escuros do flash. Toca um som de Bauhaus, que não se ouve nas FMs. O rock é pulsante, como os flashes do estrobo, como os movimentos das pessoas...

Lá em cima.

Sobre tudo isso está um salão com algumas mesas espalhadas, sofás, um divã e um balcão de bebidas. Há também uma cozinha, onde são preparados sanduíches e lanches. Ela dá saída para um pátio descoberto, também com mesas, que fica cheio quando faz calor.

No salão, o punk da capa subiu, deitou no divã e parece indiferente à movimentação do ambiente. Vários grupos de pessoas conversam, gesticulam, sorriem, dão gargalhadas, e poucas voltam os olhos para cima quando uma mulher que está lá solta um grito forte estridente. Foi a Mulher do Repolho que gritou. Ela fica dentro de uma jaula, todas as noites, comendo repolho. A jaula fica acima da porta de entrada, é uma espécie de micropalco ladeado por colunas de madeira que formam bicos no teto, como os das mesquitas orientais. O grito da mulher é uma intervenção. Impossível não reparar nele. Como também é impossível não sentir nada de diferente neste lugar. A Mulher do Repolho continua comendo lentamente o seu repolho, instigando as pessoas com gestos, caretas e olhares.

Na parede ao lado esquerdo de quem entra, lê-se, em enormes letras de neon vermelho, Madame Satã. O nome é de um personagem legendário do cenário underground carioca dos anos 30 e 40. Negro, valente, malandro e homossexual, Satã era senhor da antiga Lapa. Muitas são as histórias a seu respeito: que era homem nuns dias da semana e mulher noutros, que batia em vinte de uma vez, que era toxicômano e bom cozinheiro.

Pois ele é o "padroeiro" da Estação Madame Satã. Um lugar que não pode ser definido nem como bar nem como danceteria ou boate. Na verdade, Estação caiu-lhe perfeito. Sobre a palavra, diz o dicionário: "Estada ou paragem num lugar; onde param os trens, carros e navios; quadra de ano, temporada, oportunidade; prática religiosa; as quatro estações do ano, etc.".

Pela diversidade de tipos que se encontram no Madame Satã, dá para dizer que lá não só param trens, carros e navios, como também aviões, submarinos, naves espaciais e até mísseis atômicos. Embora seja divulgado por aí como um "lugar punk", ele é freqüentado por nativas das mais diversas tribos sediadas na Paulicéia: punks, ex-hippies, new-wavers, existencialistas, freudianos e jungianos, jornalistas e cineastas, apocalípticos e integrados, galeras dos jardins, da Henrique Schaumann e de Moema, músicos, gays, indefinidos, pobres, ricos e medianos.

Quem freqüenta o Satã há algum tempo afirma que já passou por inúmeras "oportunidades" e viu incontáveis e distintos fenômenos que marcaram várias "estações". Shows de grupos de rock, peças de teatro, exposições de arte, performances interventivas, festas-shows, desfiles e outras coisas mais.

Lá se realizou a primeira leitura ao vivo do poema "Uivo", do poeta beatnik Allen Ginsberg, feita por Claudio Wilier, também poeta e ensaísta. Na mesma época Wilier foi convidado para preparar e prefaciar a edição brasileira de Uivo, Kadish e outros poemas, de Ginsberg.

A "prática religiosa" também se incorpora ao "astral" Madame Satã. A Estação foi inaugurada em outubro de 1983 pelo ator e ex-seminarista Wilson José, que a concebeu como espaço de transgressão, um templo dedicado ao corpo e ao espírito, ao sagrado e ao profano, ao intelecto e às várias manifestações da arte. A inauguração durou um mês, ao longo do qual artistas e intelectuais "batizaram" o templo, consagrando seus diversos espaços a personalidades do mundo artístico e cultural. O poeta Claudio Wilier, por exemplo, dedicou os quatro pontos cardeais da casa a Allen Ginsberg, André Breton, Garcia Lorca e Octávio Paz. Paulo Herculano, músico, padrinho do espaço "porno-erudito", dedicou-o a Dercy Gonçalves e a Décio Pignatari. .A Estação foi ainda apadrinhada por uma mãe-de-santo e por um "Corpo de Bruxos", pessoas ligadas principalmente ao meio teatral e que formaram uma espécie de "conselho consultivo" da casa.

Embora idealizada por atores (além do Mestre de Cerimônia, Wilson, "o Satin", a Estação é também comandada por Willam, artista plástico, Míriam, atriz, e o produtor Zé Cláudio), o Madame Satã, segundo o próprio Wilson, é um antiteatro, que simboliza a ruptura. "Não é um espaço alternativo, mas alterativo. Catalisa todos os desejos e taras de seu tempo."

Na opinião dos punks, o Satã é um dos últimos "potes": "Se ele se quebrar", dizem, "todos ficamos ao relento". Wilson explica que é por esse motivo que eles nunca foram vistos quebrando alguma coisa lá dentro. Para os punks, o Satã também é um templo...

Mas por trás da frase dos punks, dos gritos da Mulher do Repolho, do som que não toca nas FMs, enfim, de tudo o que caracteriza o Madame Satã como um lugar diferente de outros procurados no velho bairro do Bexiga nos fins de semana paulistanos, existe um aspecto fundamental, que atrai a gregos e goianos. é algo que responde a um anseio comum dos diversos grupos de pessoas que por lá aparecem: a possibilidade de cada um se expressar da maneira que quer. Na vida cotidiana, as pessoas são forçadas a vestir a máscara que melhor as ajusta ao meio social, amalgamando características do eu e do outro nessa máscara. Acontece que muitas vezes o outro fica muito mais forte, pesado, e desequilibra o amálgama.

Pois o Madame Satã é o lugar dos descontentes com esse desequilíbrio. é onde cada um tem a possibilidade de usar a máscara com a qual se sente melhor, a mais expressiva de suas fantasias (emprego o termo máscara porque ele representa bem o pique do Satã). E é o componente artístico, origem da ideia Madame Satã, que catalisa essas fantasias. A partir dele se instaurou um espaço aglutinando teatro, dança, música, vídeo-arte, artes plásticas, códigos gestuais, visuais e de comportamento que escapam das FMs, isto é, das Freqüências Moduladas (ou Modeladas) Sociais.

O Satã é uma estação que não sintoniza com a Constituinte. Para Wilson, as adesões a campanhas políticas recentes não passam de "oportunismo de merchandising", sem conseqüências políticas reais. "As pessoas deixam de questionar o próprio rabo para conjecturar sobre o destino da Lua", diz o Satin. "Prefiro festejar o dia da padroeira do Brasil, promovendo uma romaria, a compactuar com o merchandising político."

Mas o pique do Satin ainda vai mais além. Ele redige um fanzine mensal da Estação, com matérias sobre música, cinema, teatro, etc. E recentemente conseguiu que uma gravadora produza um disco com músicas tocadas no Satã.

E daí surge a pergunta: a Estação vai continuar fora das FMs? Wilson diz que sim. Ele reafirma que sua idéia não é montar um esquema de produção alternativo, mas criar uma marca de transgressão. Mesmo que precise de patrocinadores para isso, o Satã não deixará de ser o espaço das mutações, dos eventos únicos, aglutinador "dos desejos e taras do seu tempo". E qualquer que seja o tempo, ou estação, uma coisa é certa: sempre haverá o que ser mudado, transformado, transgredido, pois sempre haverá desejos fora de sintonia.

Luzes estroboscópicas, fumaça e música punk constroem o paraíso de Madame Satã, num porão da Paulicéia.
Seu patrono, e famoso malandro Madame Satã, homossexual e negro que dominava a Lapa carioca.
Canalizando as freqüências fora das ondas, o Madame Satã é um templo que não pode ruir.
Um lugar onde cada um veste e exercita a fantasia que quiser como quiser.
Até quando será possível permanecer fora das FMs? é um desafio que o pessoal do Satã jura que é capaz de encarar.

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