Por TÁSSIA REGINO
Mais um ser humano queridíssimo e iluminado a homenagear, porque nos deixou! E desta vez é uma perda quase familiar, do tanto que eu gostava do Ariano.
Mais um ser humano queridíssimo e iluminado a homenagear, porque nos deixou! E desta vez é uma perda quase familiar, do tanto que eu gostava do Ariano.
No meio da pancada que é a perda, pensei em duas coisas que podem ser
sem importância nenhuma: ainda bem que eu vi ao vivo uma Aula Espetáculo dele e
isto ficará comigo pra sempre; e ainda bem que Pernambucano é agradecido e
antecipado e conseguiu homenageá-lo em vida na nossa maior festa (Ariano foi o
homenageado do Galo da Madrugada, no Carnaval do Recife deste ano!).
Antes que alguém me fale que ele é paraibano, quero deixar registrado
aqui o depoimento dele, que o torna meu conterrâneo integral: "A Paraíba é meu estado materno e Pernambuco meu
estado paterno." Segundo ele, só depois que chegou a esta equação
conseguiu se "libertar dessa
dilaceração que desde os 15 anos me perturbava".
Afora tudo que todo mundo já sabe dele, o fato é que ele era uma
figura!!! Lembro dele na faculdade com as roupas feitas por costureiras locais,
em geral de uma cor só e depois com o seu traje de festas: Terno preto e camisa
vermelha (Sport Fino, dizia ele, rubronegro fanático. Ninguém perfeito ! rs rs). Uma figura sempre! Como quando ele fala do
amor pela mulher Zélia: "(Zelia) Foi
um encontro fundamental para mim. Até o ano de 1951 eu só escrevia tragédia.
(....) Depois de conhecer Zélia e entrar no Teatro do Estudante foi que comecei
a usar esta veia cômica." Gente, pra mim, isto é o máximo de
declaração de amor: ela trouxe o sorriso prá minha obra!
A soma das duas partes, o homem e o artista, faz dele uma dessas
pessoas que a gente gosta, tanto pela vida quanto pela obra.
Na parte da obra, acho impressionante, como ele era universal falando
a partir do seu mundo e do sertão especialmente. Era uma arte produzida a
partir da vida, mas diferente dela, como ele mesmo dizia: "Eu acho que a arte, por natureza, não é uma
imitação do real, é uma recriação. (...) Se fosse para imitar a realidade do
dia a dia, melhor seria ficar com a própria realidade". A
versão menos séria desta tese ele defendia quando se dizia "um mentiroso que mente por amor a arte"
ou quando falava "na minha vida não
acontece nada. Se eu não mentir, o que é que eu vou contar?".
Noves fora o humor, ele tinha uma frase muito bonita sobre sua missão como
artista: "A gente escreve pra
celebrar a vida e protestar contra a morte".
No quesito das coisas da vida tem algumas coisas ditas por ele
(diretamente ou por seus personagens) que eu listo entre algumas das minhas
filosofias de vida: "Quem gosta de
tristeza é o diabo" (do Alto da Compadecida) e "Tenho duas armas para lutar (...) o riso a cavalo e
o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura e fascinante tarefa de
viver." E agora, no meio das homenagens, aprendi mais uma que
vou adotar: "Nunca me perguntaram se eu queria nascer. Mas eu
gostei tanto, que eu voltaria cem vezes"
E neste quesito da vida, sem duvida, uma coisa sobre a qual ele pensou
muito foi sobre a morte. Acho que ele estava preparado, ou pelo menos, que fez
um bom acordo com Caetana. Pra quem não sabe, trago as palavras dele para
explicar: "na minha terra, o
interior da Paraíba, a morte é uma mulher e tem nome: se chama Caetana. Alias,
é o único jeito de eu aceitar esta maldita: que quando venha seja uma mulher e
bonita". A Leda
Alves, secretaria de Cultura de Pernambuco disse que em sua
última aula-espetáculo, na 6ª feira passada, em Garanhuns, ele falou sobre sua
morte de uma forma diferente: "No
fim da aula, ele sempre diz: ´Não pensem não. Eu não vou morrer, eu me escondo
da Caetana. Ela não vai me encontrar´. Mas, desta vez, ele disse assim: ‘Eu sei
que vou morrer, mas meus personagens ficarão todos com vocês´".
Eu acho, de verdade, que ele tinha feito um acordo consigo, bem falado na frase
da ultima aula ( que tem a ver com a obra), mas também em outra frase que tem a
ver com a vida: "O homem nasceu para
a imortalidade. A morte foi um acidente de percurso. Mas depois que eu me
tornei pai e avô, descobri que a família é quase uma imortalidade, porque é uma
continuidade"
O fato é que mesmo naquilo que a gente divergia dele era bom ter
aquela inteligência do outro lado, prá melhor o nosso argumento. E agora os
personagens dele ficarão com a gente, o próprio personagem que ele foi também
ficará, mas nós mesmos ficamos sem ele, e por isso, ficamos mais pobres. Mas
mesmo triste, prefiro celebrar a alegria trazida por ele !
ALGUMAS
FRASES CÉLEBRES DO ARIANO:
SOBRE ELE E A VIDA
“Dizem que todas as pessoas têm um lado bonito. Então acho que sou um círculo”.
“Dizem que todas as pessoas têm um lado bonito. Então acho que sou um círculo”.
"Que eu não
perca a vontade de ter grandes amigos, mesmo sabendo que, com as voltas do
mundo, eles acabam indo embora de nossas vidas."
"A alma humana
divide-se no hemisfério rei e no hemisfério palhaço. O que há de trágico é
ligado ao primeiro, e o que há de cômico, ao segundo. O hemisfério rei se
complementa com o hemisfério profeta. O hemisfério poeta, com o palhaço. No meu
entender o ser humano tem duas saídas para enfrentar o trágico da existência: o
sonho e o riso", em
entrevista à Folha em 2005.
“Em duas coisas
eu acredito: no sonho e na força do povo”
"Não sou
otimista nem pessimista. Acho os primeiros ingênuos e os segundos, amargos. Eu
procuro ser realista esperançoso.."
“Eu sou um homem da
esperança. Não como a maioria dos velhos, que dizem: “No meu tempo era tudo
melhor.” Eu acho que no meu tempo era tudo pior. Melhorou muito. O que me
angustia no Brasil, principalmente, é esse abismo entre o país dos
privilegiados e dos despossuídos. E olha que está bem melhor, pois baixou a
taxa dos que estão abaixo da linha da pobreza para a mais baixa da história
brasileira. Ainda assim é um horror (...). Mas isso alenta minha esperança
(...).”
"Eu digo sempre
que das três virtudes teologais, sou fraco na fé e fraco na qualidade, só me
resta a esperança."
"Um marco de
minha vida foi a leitura de uma frase d'Os Irmãos Karamazov': 'Se Deus não
existe, tudo é permitido'. Sartre tirou essa dúvida, porque a frase é duvidosa.
Ele disse: 'Deus não existe, portanto tudo é permitido'. Eu tirei a conclusão
contrária, eu digo que nem tudo é permitido e portanto Deus existe. Ou a norma
moral tem um fundamento absoluto, ou ficaria ao sabor da opinião individual de
todo mundo, inclusive de estupradores e assassinos", em entrevista à Folha
em 2012.
“Quem gosta de
ler não morre só”
“Terceira idade
é para fruta: tem a verde, a madura e a podre”
“A humanidade se divide em dois grupos: os que
concordam comigo e os equivocados” (este modesto blogueiro concorda )
A obra que ilustra o texto é de Thiago Amorim. "Mulher Vestida de Sol"
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